terça-feira, 15 de março de 2022

CORANTE AZUL DE TOLUIDINA


O corante azul toluidina (CAT) é um corante metacromático básico de tiazina, que tem uma grande afinidade com os componentes ácidos do tecido, manchando assim os tecidos ricos em ADN e ARN. O epitélio dos genitais externos não tem células nucleadas e impede o contacto da coloração com os núcleos. Quando o epitélio é danificado e as células nucleadas subjacentes são expostas, a coloração dos núcleos é azul (Corante nuclear).

O colorante azul de toluidina é fácil e seguro de usar, disponível, barato e não interfere com os vestígios médico-legais. Não há efeitos adversos na deteção e identificação do ADN com a utilização do CAT.

As estruturas mais prováveis a serem feridas durante a penetração genital são a forqueta posterior, a fossa navicular, o hímen e os pequenos lábios. As lesões genitais e anais geralmente encontradas durante o exame clínico são subtis, superficiais e não mostram tipicamente a presença de sangue na superfície. As lesões perianais são geralmente sob a forma de múltiplas lacerações radiais da área perianal dentro e fora da linha média e que se estendem até ao ânus. A cor do tecido normal nestas estruturas é tipicamente semelhante à do tecido lesionado.  As lesões provocadas pela penetração genital mostram uma distribuição distinta. As lacerações apareceram mais frequentemente na forqueta posterior e na fossa; as abrasões aparecem nos pequenos lábios.

É seguro para utilização em humanos. Embora possa ocorrer uma ligeira sensação de picada, não tem quaisquer efeitos adversos a longo prazo e não interfere com os vestígios biológicos.

De acordo com um estudo de Slaughter, foi descoberto que as lesões devidas à penetração genital cooperativa e consensual são geralmente limitadas apenas a uma pequena lesão num local anatómico genital. Se mais do que um sítio anatómico genital apresentar lesão, a probabilidade de a penetração ter ocorrido com consentimento e cooperação diminui bastante. 

Há pouca investigação sobre a utilização do CAT na medicina legal para detetar lesões, mas um estudo de McCauley descobriu que a deteção de lacerações vaginais aumentou de 1 em 24 para 14 em 24 nos casos relatados de violação de adultos quando foi usado o corante. Noutro estudo de Lauber e Souma, foram detetadas lesões em 1 em 22 pacientes após relações sexuais consensuais, mas depois de examinados pelo corante dentro de 48 horas após alegada violação, 70% das mulheres nulíparas e 40% do número total de pacientes tiveram uma absorção positiva do corante. No estudo de Slaughter, foram encontradas lesões genitais em 11% das mulheres após relação sexual consensual e 89% após violação.

O corante mancha todas as células nucleadas expostas e produz resultados positivos em vulvite, herpes e outras ulcerações, lesões autoinfligidas, condições dermatológicas etc. Nos casos em que a causa da perturbação não é clara, a história deve ser utilizada para sugerir um diagnóstico diferencial, que deve ser investigado conforme indicado. É também por isso que fazemos o exame com espéculo após a aplicação do corante, uma vez que o espéculo pode causar pequenas lesões no tecido através da sua inserção.

 Indicadores para distinguir entre resultados positivos devido à penetração vs. outras causas

            1. A distribuição e natureza da área danificada difere entre as diferentes causas de danos epiteliais.

            2. Em condições herpéticas e outras ulcerosas, a mancha aparecerá nas típicas pequenas úlceras do epitélio mucocutâneo.

            3. A vulvite apresenta-se como uma captação desigual do corante e é pouco provável que seja simétrica.

            4. A lesão autoinfligida devido ao coçar pode estar presente na presença de uma história de prurido. É improvável que se apresente como uma única escoriação visível e que tenha uma aparência irregular. As condições dermatológicas ou infeção causadora de prurido devem ser excluídas.

            5. A distribuição das fissuras é linear e ocorre geralmente na fossa navicular e na forqueta posterior na área da genitália entre as 3h – 9h.

            6. O abrasão devida à penetração genital aparece como uma área azul difusa numa distribuição simétrica na fossa navicular.

            7. Geralmente, as lesões genitais devidas à penetração genital da mulher localizam-se entre as 5 e as 7 horas na fossa navicular e na forqueta posterior.

Quando mal aplicado, é uma preocupação, uma vez que as lesões podem ser excessivas, uma vez que todo o agrupamento de corantes não é reconhecido como tal. O corante deve ser utilizado como um marcador, e não como um projetor.

Considerações do Tribunal

 A presença de lesões ano genitais em casos de violação é da maior importância nas audiências judiciais. A perceção geral é de que a violação deve resultar em lesões. Uma vez que os procuradores só processam casos de violação quando esperam uma condenação, podem estar relutantes em processar os casos em que não há lesões. Com a devida utilização do corante, são demonstrados os ferimentos em mais vítimas de violação. A defesa geralmente defende de que o ato sexual foi consensual e a pergunta regular é: "Pode descartar relações sexuais consensuais com base no exame médico? Temos que admitir que o cenário é possível independentemente do quadro clínico. O que o procurador precisa saber para decidir com clareza, é a observação adicional "sim, é possível, mas neste caso é improvável, uma vez que encontrei lesões em vários locais anatómicos, o que não é compatível com relações sexuais consensuais e cooperativas".

No estudo de Rambow, existe o relato que em 182 casos de agressão sexual, 53 dos quais tinham potencial para uma acusação bem sucedida com uma vítima disposta a testemunhar e um agressor identificado. Eles verificaram ainda que 34% dos casos resultaram numa acusação bem sucedida, e as provas de danos genitais ou não-genitais foram associados a um resultado legal bem sucedido.

 Processo de aplicação do corante azul toluidina

            1. Recolher todas as amostras genitais externas, conforme indicado pelo exame antes da aplicação do corante.

            2. Antes do exame com espéculo, aplicar 1% de azul toluidina na vulva. O ânus também pode ser corado. Não utilizar o corante na abóbada vaginal ou nas mucosas (evitar o hímen). O corante azul de toluidina pode ser usado nos grandes lábios, pequenos lábios, forqueta posterior, fossa navicular, corpo perineal, e área perianal. (Foco nas áreas entre as 3 horas e as 9 horas, pois é aqui que ocorrem a maioria das lesões).

            3. Deixar secar durante um minuto.

            4. Remover o excesso de corante com uma geleia lubrificante solúvel em água, manchando suavemente a área até que o excesso de corante seja removido. 

            5. NÃO ESFREGAR a área.

            6. Fotografar a área, se indicado (e consentimento informado obtido).

            7. O corante desaparece em 1 a 2 dias.

 


sábado, 5 de março de 2022

Despiste na Madeira: estado dos cadáveres vai facilitar a identificação dos mesmos | Especial «Festa na Praia em Albufeira» | TVI Player

Despiste na Madeira: estado dos cadáveres vai facilitar a identificação dos mesmos | Especial «Festa na Praia em Albufeira» | TVI Player: Um acidente com um autocarro de turismo na estrada da Ponta da Oliveira, na ilha da Madeira, provocou 29 mortos e 27 feridos. Das vítimas mortais, 11 são homens e 18 mulheres. Há ainda 28 feridos no Hospital do Funchal. Albino Gomes, enfermeiro forense, foi convidado na 25ª Hora, na TVI24

Morte Violenta

DEFINIÇÃO 

A morte violenta é a morte de causa não-natural. Assim, é a morte causada por agentes externos. Pode ser de várias etiologias médico-legais: acidental, suicida ou homicida (face à etiologia médico-legal natural).

TIPOS DE AGENTES EXTERNOS 

Os agentes externos causadores de morte podem ser (1)mecânicos, (2)físicos, (3)químicos ou (4)tóxicos. Vamo-nos debruçar mais adiante principalmente sobre os agentes mecânicos1. No entanto, far-se-á uma pequena introdução aos agentes físicos e químicos em seguida: 

Agentes Físicos:


1. Calor (tabela 1) a. Fogo – queimaduras de 1º, 2º, 3º e 4º graus; pêlos e cabelos chamuscados ou queimados; extensão variável; provoca a evaporação de água que leva a ↑ pressão intracraniana e intracavitária; coagulação das proteínas (retracção muscular) 
b. Líquidos em ebulição – queimaduras de 1º, 2º e 3º graus; em forma de sulcos ou salpicos; sem alteração dos pêlos/cabelo 
c. Objectos sólidos / metais ao rubro – queimaduras de 1º, 2º e 3º graus; extensão localizada e modelada; cabelos e pêlos retorcidos 
d. Gases / Vapores – queimaduras de 1º e 2º; grande extensão; sem alteração dos pêlos/cabelos 
e. Insolação – queimaduras de 1º, 2º e 3º graus e desidratação; pela exposição directa ao sol 
f. Golpe de calor 
g. Hiperpirexia 







2. Frio a. Exposição Sistémica 
b. Exposição Localizada – queimaduras de 1º, 2º e 3º graus, "frieiras" e "geladuras" 


3. Electricidade a. Corrente Eléctrica – provoca electrotrauma cuja gravidade depende da natureza (corrente contínua ou alterna), voltagem, frequência, intensidade e percurso da corrente no corpo 
b. Electricidade Atmosférica – efeitos imediatos: perda de consciência, surdez, queimaduras cutâneas; efeitos tardios: EAM, hemorragias cerebrais, cataratas; pode levar à morte por fulguração
c. Ondas Electromagnéticas 


4. Radiações a. Efeitos imediatos – queimaduras por radionecrose 
b. Efeitos tardios – neoplasias, esterilidade, malformações 


Agentes Químicos 

Substâncias químicas que, em contacto com a pele ou mucosas provocam necrose celular – queimadura química. Apresenta o mesmo grau em toda a sua extensão, contornos nítidos e por vezes forma de sulco ou salpicos. As complicações dependem da sua localização e extensão. 

INVESTIGAÇÃO MÉDICO-LEGAL DA MORTE 


Em caso de Morte de Causa Ignorada








O principal objectivo a Autópsia Médico-Legal é a Determinação da Etiologia Médico-Legal da Morte (para que esta possa ser certificada). Para efeitos de aplicação do direito, a etiologia médico legal da morte pode ser natural, acidental, suicida (podendo dispensar autópsia se não existirem outras implicações legais) e homicida. Além deste objectivo primordial, podem ser descritos outros objectivos tais como: 

Identificar positivamente o cadáver. 
Determinar a causa, mecanismo e tipo de morte. 
Excluir outros factores que possam ter contribuído para a morte. 
Determinar o tempo decorrido desde a morte. 
Demonstrar todas as anomalias, malformações e doenças externas e internas. 
Descrever qualquer lesão externa e interna. 
Estabelecer um nexo de causalidade entre o agente externo e a morte. 
Obter amostras para análise microbiológica e histológica e outras investigações necessárias. 
Conservar tecidos e órgãos relevantes como prova. 
Obter fotografias e vídeos que sirvam de prova. 
Elaborar um relatório completo que inclua todos os achados. 
Providenciar uma interpretação qualificada desses achados. 

A autópsia médico-legal é realizada pelo médico legista e o auxiliar de perícias tanatológicas tendo um procedimento específico que envolve (1)considerar as circunstâncias em que ocorreu a morte, (2)exame do hábito externo, (3)exame do hábito interno e (4)realização de análises laboratoriais (toxicologia). Dada a importância do exame do hábito externo em contexto médico-legal de morte violenta, é importante avaliar a superfície corporal e caracterizar as lesões traumáticas na sua (1)localização, (2)região anatómica afectada, (3)natureza da lesão (equimoses, escoriações ou feridas) e (4)natureza do agente externo. 


Agentes Mecânicos Os agentes mecânicos podem ser de vários tipos: 

1. Instrumentos Contundentes – superfície plana ou romba 
2. Instrumentos Cortantes – superfície linear 
3. Instrumentos Perfurantes – superfície punctiforme 
4. Instrumentos Mistos a. Corto-Perfurantes (ex: armas brancas) 
    b. Perfuro-Contundente (ex: armas de fogo) 
    c. Corto-Contundente (ex: machado)         
    d. Perfuro-Contundente (ex: picador de gelo) 



Toxicologia Forense

 O objectivo da Toxicologia Forense é pesquisar e quantificar substâncias consideradas tóxicas no organismo, de modo a investigar a etiologia médico-legal das intoxicações para fins judiciais. Para isto podem ser utilizados vários tipos de amostras, dependendo do caso e do tipo de análise requerida, e estas amostras devem seguir regras de preservação e tratamento, de modo a poderem ser utilizadas como prova. 

AGENTES EXTERNOS TÓXICOS 


Definição – “Substância que provoca no organismo alterações de elementos bioquímicos fundamentais à vida. Podem actuar sobre a célula produzindo uma destruição global da mesma por processos de necrose, ou sobre o sistema enzimático ou partes selectivas da célula (membranas, estruturas endocelulares ou organelos celulares).” Consideram-se substâncias venosas ou análogas todas aquelas capazes de provocar dano ao indivíduo a quem são administradas, seja pelas suas características, concentração ou quantidade. Chama-se agente químico àquele que em contacto com a pele ou mucosas induz necrose celular, originando uma queimadura química. Estes agentes agentes são importantes para as várias áreas da toxicologia: 

Toxicologia Industrial e do Trabalho (relacionada com a medicina do trabalho) 

Toxicologia Alimentar (relacionada com a saúde pública) 

Toxicologia Clínica (no diagnóstico e tratamento de todo o tipo de intoxicações) 

Toxicologia Forense (na investigação da etiologia médico-legal das intoxicações) 


Como exemplos de casos onde se aplica a toxicologia temos as situações de ofensas corporais/homicídio, alterações psiquiátricas, etilismo, toxicomanias, dopping, etc. 

Quanto à sintomatologia, a maioria das intoxicações apresenta um quadro comum, sendo os sintomas frequentemente inespecíficos. Assim, os mais frequentes e também mais graves são: síndromes hepáticos por toxicidade hepática directa, síndromes nefrotóxicos, coma, alterações cardiovasculares/respiratórias/hematológicas, neuropatias periféricas e síndromes dermatológicos. 


ETIOLOGIA MÉDICO-LEGAL DAS INTOXICAÇÕES 
Acidental (acidentes domésticos, profissionais e terapêuticos; picadas de insectos) 
Suicida (intenção auto-destrutiva) 
Homicida (ofensas à integridade física) 
Drogas de abuso (ex: overdose2
Etiologia indeterminada. 

TOXICOCINÉTICA
Na toxicologia em geral, e especialmente na toxicologia forense, há sempre que ter em conta a cinética da substância em estudo. Esta engloba: 
Absorção (tubo digestivo, percutânea, parentérica) 
Distribuição (relacionada com o transporte do tóxico para os locais de acção ou de reserva)

Biotransformação (modificação da substância a nível celular, com a formação de metabolitos de menor, igual ou maior toxicidade que o tóxico original) 

Eliminação (através do suor, urina, ar expirado, etc) 


CLASSIFICAÇÃO DOS TÓXICOS 


Gasosos/voláteis (CO, etanol) 

Pesticidas (paraquat, paratião, dimetoato) 

Medicamentos (benzodiazepinas, hipnóticos, etc) 

Metais pesados (arsénio, tálio, alumínio, mercúrio) 

Drogas de abuso/estupefacientes (cocaína, opiáceos, LSD, drogas sintéticas) 


 
Intoxicação por Monóxido de Carbono: Penetrando no organismo através da respiração, o monóxido de carbono entra com facilidade nos pulmões e no sangue, combinando-se com a hemoglobina e dificultando o transporte de oxigénio para os tecidos. Existem dois tipos de intoxicação: - A intoxicação crónica, cujos sintomas são dores de cabeça, náuseas, vómitos e cansaço, a qual se poderá desenvolver de forma lenta e afecta pessoas habitualmente expostas a concentrações elevadas de CO. Frequentemente os sintomas não são atribuídos de imediato ao CO, mas à ingestão de produtos alimentares ou outras causas e assim, só tardiamente, quando a mobilidade já é afectada e surgem problemas neurológicos, é que as causas são identificadas pelo médico. Sempre que houver suspeitas de intoxicação crónica, deve recorrer-se aos serviços de saúde e contactar as entidades qualificadas para inspeccionar a instalação. 
- A intoxicação aguda, que provoca vertigens, fraqueza muscular, distúrbios visuais, taquicardia, perturbações de comportamento, desmaios e, no limite, o coma e mesmo a morte. Acontece este tipo de intoxicação afectar vários membros da mesma família, ou mesmo todo um grupo de pessoas presentes na mesma sala de reunião ou de festa, pois as vítimas não chegam a aperceber-se do risco em que incorreram. Quanto à etiologia médico-legal, pode ser uma intoxicação acidental, suicida ou homicida (raro). 

Intoxicação por Pesticidas Os pesticidas são substâncias muito utilizadas na agricultura para matar a fauna e a flora que destrói as culturas. São também frequentemente aplicadas no ambiente doméstico, sendo uma causa importante de intoxicação acidental infantil. Quanto à sua etiologia médico-legal, a intoxicação pode surgir num contexto acidental (laboral, doméstico, etc), suicida (frequente, pela facilidade de aquisição) e homicida (raro).